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Será que estamos criando conteúdo inclusivo para pessoas com autismo?
Para responder a essa pergunta, chamamos duas mulheres com autismo que trabalham na Resultados Digitais: a Luciane Marques, revisora e produtora de conteúdo da RD University, e a Thaís Mösken, do time de Sales Ops.
Neste post, elas descrevem sua relação com o consumo de conteúdo e dão dicas para quem quer aprimorar a comunicação digital com pessoas com autismo.

Fonte: Livro “A diferença invisível”, de Mademoiselle Caroline e Julie Dachez
Sobre o autismo
Atualmente, o termo autismo tem sido cada vez mais compreendido em termos de “espectro” devido à ampla gama de variações que a condição pode apresentar. Embora os indivíduos com autismo leve pareçam iguais a qualquer outra pessoa, por possuírem aparência e intelecto igual, suas diferenças e déficits são invisíveis e profundamente dolorosos.
As dificuldades em compreender as regras sociais e informações subliminares, assim como o porquê das máscaras sociais, são apenas a superfície destes indivíduos de hábitos repetitivos. A parte mais profunda e cruel esconde uma sensibilidade sensorial excessiva, o que deve-se ao fato de seu cérebro possuir uma formação diferente do padrão. Algumas partes do cérebro autista são exageradamente desenvolvidas e outras, subdesenvolvidas.
Lugares ruidosos, quentes, com excesso de luminosidade e intensa movimentação de pessoas podem gerar uma sobrecarga sensorial e resultar em uma crise. A forma de absorver e armazenar aprendizado também é diferente.
As principais diferenças de absorção de conteúdo
A capacidade dos indivíduos neurotípicos absorverem e armazenarem o conhecimento transmitido de forma oral (palestras, vídeos, áudios) é 10 vezes maior do que a de um autista.
Indivíduos autistas, no entanto, possuem uma capacidade de absorver o conhecimento transmitido de forma visual (textos e imagens) 10 vezes maior que a de um não-autista.
As imagens abaixo ilustram a atividade do cérebro de uma pessoa com autismo (esquerda) e de um cérebro típico “normal” (direita) ao serem expostos a estímulos visuais (rosa) e auditivos (azul).
Fonte: Walt Schneider Lab
Essas diferenças de processamento de informações alteram drasticamente a relação das pessoas com autismo em relação à comunicação. A seguir, elencamos pontos essenciais para a formulação de conteúdo que atendam melhor às características de aprendizado desse público.
A melhor forma de acessar o conteúdo
O conteúdo escrito precisa ter uma linguagem concisa e direta, sem muita repetição de palavras e que não deixe margem para interpretação ambígua. (Luciane)
Os autistas são muito diversos. Apesar de termos algumas características em comum, certamente existem autistas que gostam de formatos de áudio e vídeo, por isso é muito perigoso apenas generalizamos e tratarmos todas as pessoas dentro do espectro como algo homogêneo. É essencial ressaltar essa diversidade, mesmo dentro de um grupo restrito, para que eu possa desenvolver a minha resposta. Particularmente, prefiro consumir conteúdo em texto com linguagem técnica, clara e direta, com exemplos práticos. Eu ouço podcasts e assisto filmes, mas a absorção de conteúdo por essas mídias é mínima. Todas as semanas ouço um podcast de política internacional que dura mais de duas horas, e, por mais que goste do programa e me divirta, depois não lembro quase nada do que eles falaram. (Thaís)
Melhores canais de comunicação
Formato de texto, com imagens associadas, em tons vibrantes e chamativos. Cores em tons pastéis ou cores frias podem passar despercebidas, enquanto cores quentes conseguem prender a atenção e fixar melhor o conteúdo na memória. Jamais o conteúdo deve ser unicamente em áudio e vídeo. (Luciane)
Falando por mim e pelos outros autistas que se identificam com essa dificuldade em aprender com áudios e vídeos, eu prefiro conteúdo escrito, com frases concisas em texto corrido. Gosto de imagens, mas não de gifs, pois não consigo ler o texto adjacente ao gif sem tapá-lo com a mão, ou de forma similar. Se for para ver conteúdo em vídeo, para mim funciona melhor com legenda e apenas para diagramas/imagens do que está sendo ensinado, ou no caso de um passo a passo de como fazer algo que pediria uma sequência imensa de printscreens se fosse em texto. Não vejo nenhuma vantagem em olhar para o rosto de alguém no vídeo, a não ser que o que preciso aprender esteja no rosto dela (como quem ensina a fazer expressões faciais). (Thaís)
Uma dica para os criadores de conteúdo
O ideal é que todo conteúdo seja em formato inclusivo. As pessoas neurotípicas compreendem e fixam melhor o que ouvem, mas nós, autistas, precisamos “ver” o texto escrito, para conseguirmos compreender, assimilar e memorizar. (Luciane)
Os criadores de conteúdo devem sempre se lembrar de que há muitas pessoas diferentes. Podemos conscientemente saber que nosso conteúdo não atende a todos, pois nenhum conteúdo o faz, o que não invalida um trabalho ou uma mídia. O importante é que todos tenham uma proposta de conteúdo inclusivo e deem importância ao tema. (Thaís)
Para conhecer mais sobre autismo
O autismo impacta mais de 70 milhões de pessoas no mundo (Organização Mundial da Saúde) e ainda há muitas dúvidas sobre o espectro. Para auxiliar quem deseja conhecer mais sobre o assunto, a Luciane e a Thaís fizeram uma lista de sites, blogs, perfis de influenciadores e canais do YouTube que são ótimas fontes de informações de aprendizado sobre o tema.
- Podcast e canal no YouTube Introvertendo. A Thaís é uma das integrantes e indica alguns episódios: Mulheres Autistas e Regras Sociais.
- Canais do YouTube do Willian Chimura (Um canal sobre autismo) e do Leonardo Akira (Leo Akira)
- Páginas no Facebook: Xícara de Café com Chá – Aventuras de uma Mulher com a Síndrome de Asperger, Autísticos.
- Blog do Ben Oliveira (a Luciane indica o post sobre o subdiagnóstico em mulheres autistas)
- Sites: National Autistic Society e What Is Asperger Syndrome?